Jornal O Cruzeiro do Sul publica texto avaliativo da II Semana de Pedagogia
Desafios contemporâneos da educação
Entre os dias 25 a 29 de outubro realizou-se a II Semana do Curso de Pedagogia da UFSCar-Sorocaba. Em sua primeira edição, em 2009, o evento reuniu cerca de 100 pessoas, constituindo-se como uma das primeiras parcerias entre o curso de Pedagogia da UFSCar e a comunidade educacional da região. Com o intuito de dar continuidade a este trabalho e especificamente debater os desafios contemporâneos da educação, da segunda edição participaram mais de 250 pessoas, com a apresentação de 70 trabalhos acadêmico-científicos de várias instituições de ensino superior do Estado, 5 Mesas de Debate, oficinas e comunicações de pesquisas e experiências de trabalho pedagógico.
Logo na abertura, o Editor Chefe do Jornal Cruzeiro do Sul, Anclar Patric Crippa Mendes, apontou aquele que seria identificado pelos demais participantes da II Semana como um dos desafios contemporâneos da educação: a inclusão. Arrisca-se afirmar que este tema foi o maior desafio apontado pelos participantes da II Semana. Esta escolha justifica-se, inclusive, pela opção de estrutura do evento, que além de optar por organizar palestras de temáticas ampliadas, também se abriu à participação de profissionais da educação que apresentaram seus trabalhos pedagógicos em forma de comunicação, pôster ou no oferecimento de oficinas voltadas à construção de instrumentos de intervenção pedagógica, constituindo-se em uma oportunidade de criação de espaços de diálogo sobre o que ocorre no interior das instituições educativas.
Tomada também como objeto de reflexão pela Pró-Reitora de Graduação da UFSCar, a inclusão foi discutida no sentido mais amplo do termo, não apenas como o acolhimento socializador no espaço escolar de pessoas que têm necessidades especiais, mas também no sentido de integrá-las efetivamente ao processo de ensino-aprendizagem, precípua tarefa da escola, que exige investimentos nem sempre realizados e formação especializada dos profissionais da educação.
Nos demais dias, quando o evento ocupou o Núcleo de Educação, Tecnologia e Cultura (ETC) da UFSCar, outros desafios foram apontados, como a relação entre educação, comunidade e movimentos sociais. Essa questão foi debatida a partir do ponto de vista de que a articulação entre escola e seu entorno comunitário e social deve ser não apenas uma opção deste ou daquele educador, mas um imperativo para que se alcance a qualidade de ensino, hoje tão distante de muitos sistemas de ensino. Reconheceu-se, também, a importância de se atentar para os processos educativos desenvolvidos fora dos ambientes escolares, que são cada vez mais importantes nos dias atuais na determinação da personalidade, do caráter, da visão de mundo, da ação e dos valores das pessoas, sobretudo das crianças e dos adolescentes. E mais uma vez a questão da inclusão esteve presente, pois se ouviu que uma escola includente deve ser instrumento de mobilização dos sujeitos para transformar as desigualdades e para construir outra educação.
A exigência de se ter o Ensino Fundamental com 9 anos (Lei no 1.274/10) implantado até 2010 foi apontado com um dos desafios educacionais imediatos da educação nacional. A história deste processo revelou-se articulado à questão da inclusão. A Mesa sobre o tema provocou a pensar sobre as contradições existentes entre o espaço das lutas históricas por uma escola que atenda a todos com qualidade e as nuances das políticas educacionais, as contradições entre a luta, os ideais e o que é efetivado pelos governos. Sobre essa questão, os debatedores constataram a importância de se ter a criança com mais tempo na escola, como é praxe em muitos países cuja qualidade do ensino é bem superior à brasileira. Contudo, indicou-se que a forma como foi e está sendo implantada a escola de 9 anos gerou e gera algumas confusões e dificuldades, como o não respaldo e a falta investimentos dos órgãos públicos.
A discussão sobre as dificuldades dos docentes no encontro com a criança que tem dificuldades de aprendizado também esteve presente. Estas crianças frequentemente são rotuladas como fracassadas. A fala de Silvia Rocha chamou a atenção para dimensão do olhar a ser lançado à criança, dentro de uma perspectiva histórico-cultural, por meio da qual o papel do ensino pela mediação do outro é fundamental nos processos de aprendizagem de conceitos, de conteúdos, de valores e de atitudes, que não se desenvolve linearmente, porque são repletos de contradições. Novamente foi posto o desafio de incluir esta infância, com suas peculiaridades, no ensino fundamental.
No último dia da II Semana foi discutido um tema cada vez mais candente e preocupante: a violência escolar, que em muitos casos se apresenta nos ambientes sócio-educativos associada às drogas. O debate indicou a necessidade de não se estigmatizar os usuários, procurando entendê-los a partir da compreensão da realidade por eles vivida, que muitas vezes os colocam em situação de profunda vulnerabilidade, fazendo subsumir a afetuosidade, a inteligência, a sensibilidade, o interesse e a vontade transformar o mundo em um ambiente mais justo, deixando prevalecer a depressão e a insensatez. Neste sentido, focou-se também o trato com as culturas juvenis e com as instituições sociais, dentre elas a escola, que não aprenderam a lidar com estas culturas, resultando, muitas vezes, em resistência dos jovens a elas.
Enfim, a experiência da II Semana de Pedagogia apontou alguns desafios educacionais a serem enfrentados pela sociedade sorocabana no momento em que, concomitantemente, desenvolve-se economicamente e se complexifica social, política e culturalmente. Dessa compreensão resulta claro que a escola, sozinha, é incapaz de dar conta dos desafios educacionais atuais, daí a necessidade do consciente envolvimento dos indivíduos, grupos sociais, organizações e instituições na construção de outro mundo, mais justo, solidário e fraterno, que não se efetivará sem se reverter o quadro atual da educação.
Adriana Varani e Marcos Francisco Martins –
docentes da UFSCar-Sorocaba
O Cruzeiro do Sul - 4 de novembro de 2010 - Seção Carta do Leitor